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segunda-feira, 27 de junho de 2016

O medo do Estadão: a disputa pela história e pela memória em mais um golpe contra a democracia

É papel de todas as historiadoras e historiadores se posicionar diante dos acontecimentos recentes, pois são herança de um período macabro de nosso país.

Do site da FMG, em 24/06/2016

Nós, historiadoras e historiadores matriculados no Programa de Pós-graduação em História da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), manifestamos nosso repúdio e, por meio deste, respondemos ao editorial do jornal O Estado de S. Paulo, publicado no dia 14 de junho de 2016 e intitulado "O lugar de Dilma na história". Este periódico sentiu-se na necessidade de comentar um manifesto divulgado pelo movimento "Historiadores pela Democracia", que havia se reunido com a presidenta legitimamente eleita, Dilma Rousseff, no Palácio da Alvorada, para repudiar o golpe em curso no país e defender a democracia.

O referido editorial ataca profissionais da História e a própria História com inverdades. Fazendo uso do recurso retórico da crítica aos autores do argumento, não de seu conteúdo, tentam, de maneira vil, manipular ideias descontextualizadas para atribuir à nossa categoria profissional as motivações das quais se serve para produzir sua versão dos fatos: a ignorância e a mentira. Alegam que os "Historiadores pela Democracia" estariam “com pressa de antecipar a história que será escrita no futuro”. O periódico é taxativo: critica severamente a postura de profissionais de História em defesa da presidenta Dilma e da democracia que o jornal historicamente ataca, pois essa posição “não é história, é má-fé”. Segundo o Estadão, “Não haveria nenhum problema se os defensores dessa interpretação dos fatos fossem cidadãos sem qualquer responsabilidade sobre o que se ensina em sala de aula. No entanto, o que se tem hoje no Brasil é a formulação de uma espécie de pensamento único nas escolas e universidades”.

Se estivesse realmente preocupado com o combate ao pensamento único, este órgão da imprensa criticaria a proposta de uma “escola sem partido”, que limita o conhecimento ao inibir a pluralidade, o pensamento crítico e o debate. O jornal acusa historiadoras e historiadores de má-fé por apresentarem sua interpretação dos acontecimentos atuais, mas esquece que ele mesmo se posiciona na disputa política e ideológica: para o Estadão, só é história aquela que coincide com a sua interpretação. Assim, minando a liberdade intelectual e o direito das professoras e professores exercerem livremente seu ofício, o que está em jogo com esse tipo de discurso é a democracia e a cidadania nos espaços escolares.

Com este editorial, fica evidente que o próprio Estadão luta desesperadamente pela sua narrativa da história, pois é cada vez mais nítido que o afastamento de Dilma é um golpe contra a democracia e os direitos. Profissionais do jornalismo e da história tem grande responsabilidade sobre a narrativa dos acontecimentos, mas o oligopólio da mídia só se importa com um suposto ensino “ideológico” quando a ideologia não é a que defende; só se importa com a corrupção quando é praticada por seus inimigos; só se importa com a democracia quando ela garante direitos e ameaça privilégios.

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