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quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Servidores, reforma tributária e luta de classes

Em 2007 os servidores técnicos fizeram uma longa greve. O movimento organizado pela FASUBRA fez um acordo com o governo em fins de agosto, prevendo uma sequência de reajustes a começar em maio de 2008.

Veio a derrubada da CPMF por parte dos senadores do PSDB, DEMos e PSOL, deixando o cumprimento do acordo salarial em perspectiva incerta. O fim do imposto sobre movimentação financeira recolocou em cena o debate sobre como financiar a Saúde Pública, e também de modo mais geral a Reforma Tributária.

Os servidores organizados em seus sindicatos e na FASUBRA devem se preocupar, além da apreensão sobre o cumprimento dos acordos, com um debate sobre reforma do sistema de impostos do Brasil? Numa perspectiva classista, politizada, sim, para evitar que mais uma vez os ricaços do país, ajudados pela grande mídia, enganem a maioria da população com sua demagogia, e para que os ganhos salariais obtidos pelo movimento não sejam corroídos pela injustiça tributária brasileira.

O rombo dos R$ 40 bilhões da CPMF provocado pela direita e o temor da recessão nos EUA recolocaram em cena o debate sobre nosso sistema de impostos. O vacilante governo Lula parece tratar o assunto como tema meramente técnico e diz que enviará uma proposta de reforma tributária ao Congresso. Já os mesmos ricaços, sonegadores, tucanos e DEMos, culpados pelo fim da CPMF, aproveitam o clima de incertezas na economia para exigir menos impostos.

Os direitistas hipócritas alegam que a cobrança de impostos no Brasil é uma das mais altas do mundo e pregam cortes na "gastança social". Neoliberais, desatam uma nova onda conservadora em defesa do "Estado mínimo", embalada numa bandeira que desperta simpatias na sociedade.
O tema da reforma tributária é explosivo, pelo jogo de interesses que envolve. Em certo sentido, a questão tributária é estratégica, já que condensa as contradições de classe na sociedade capitalista. A tributação reflete quem perde e quem ganha neste sistema. Quem banca a máquina pública, quem abocanha os recursos arrecadados, quem sonega e dribla o fisco. Devido às graves distorções deste sistema no país, que ajudam a explicar porque o Brasil ostenta um dos piores índices de desigualdade social no mundo, a reforma tributária é realmente uma forte exigência da atualidade, mas num sentido totalmente inverso ao pregado pelos neoliberais de plantão.


"Vai resmungar na... Europa"
Excelente reportagem da revista "Carta Capital", intitulada "Leão atiça a desigualdade", desnuda como o sistema tributário brasileiro é dos mais injustos do planeta. "O assustador é que 70% dos impostos incidem sobre o consumo e apenas 30% sobre o patrimônio. Nos países desenvolvidos, a relação é oposta: 60% sobre o patrimônio e 40% sobre o consumo... Estudo do Unafisco [Sindicato dos Auditores Fiscais] comprova como a carga tributária é perversa. Quem ganha até dois salários mínimos gasta 45,8% da renda no pagamento de impostos indiretos, enquanto o peso para famílias com renda superior a 30 salários mínimos corresponde a 16,4%".

Quanto à suposta fúria do Leão sobre a renda dos ricos empresários e da alta classe média, seria educativo se os adeptos do movimento antiLula "Cansei" fossem morar na Europa ou mesmo nos EUA para deixarem de reclamar. O artigo desmonta este outro mito da mídia manipuladora. "A alíquota para pessoas físicas, aqui, vai de zero a 27,5%. Na Argentina, de 9% a 35%. Nos Estados Unidos, de zero a 35%, fora os impostos estaduais. Na França, varia de 5,5% a 40%... O imposto nativo sobre a renda tem baixa participação no total das receitas tributárias de apenas 6,6% do PIB, enquanto a média dos países europeus é de 13,6%. Além disso, no Brasil há apenas duas alíquotas, de 15% e 27,5%, enquanto nos EUA existem cinco categorias, o que torna o imposto mais justo".


A manipulação dos números
Para a especialista Leda Paulani, professora de economia da USP, o sistema tributário brasileiro é injusto porque é regressivo – quem ganha menos paga mais impostos e o setor produtivo é mais penalizado do que os que lucram com a especulação financeira. Para ela, seria necessário reduzir as contribuições que incidem sobre o consumo, que atingem toda a população, e compensar esta perda com o aumento dos tributos diretos sobre a riqueza e a renda. Mas esta briga é titânica e a correlação de forças é adversa no parlamento. "A discussão sobre o patrimônio é a primeira a ser derrubada no plenário em qualquer tentativa de levar adiante a reforma tributária", contesta.


As benesses para os ricaços
Na prática, o trabalhador é quem paga mais impostos no Brasil, já que o tributo é descontado na folha de pagamento. O chamado setor produtivo também sofre em decorrência do efeito cascata dos tributos. Já os tubarões contribuem bem menos proporcionalmente, quando não sonegam ou driblam o fisco através das isenções e elisões fiscais (brechas na legislação) e da informalidade. Parte destes bilhões não arrecadados é desviada para os paraísos fiscais no exterior. No caso da economia informal, Pedro Tolentino, presidente da Unafisco, afirma que é impossível mensurar o desfalque, "mas há cálculos de que, para cada um real pago à Receita, um real é sonegado".

A revista "Carta Capital" ainda registra outras três benesses concedidas aos ricaços. Até hoje não foi regulamentado o Imposto sobre Grandes Fortunas, apesar de ser contemplado na Constituição de 1988. Já os latifundiários e barões do agronegócio são beneficiados pelas medíocres alíquotas do Imposto Territorial Rural (ITR), além de contarem com a precária estrutura de fiscalização no campo. "Por fim, os grandes sonegadores abrigam-se no Judiciário, diz Khair. ‘Uma execução fiscal leva anos e anos para ser resolvida’. Não raro, quando a decisão sai, o devedor já fechou as portas, mudou a razão social ou lançou mão de outra manobra para não quitar os débitos".

De todos os setores da burguesia beneficiados pelo injusto sistema tributário o que menos pode reclamar é o capital financeiro. Principalmente a partir do reinado de FHC, de 1995 a 2002, a legislação privilegiou banqueiros e rentistas. "A remuneração dos juros de capital próprio permitiu que os cinco maiores bancos do sistema financeiro nacional tivessem uma redução nas despesas com encargos tributários no montante de R$ 2,1 bilhões em 2005. Isso num ano em que lucro líquido das instituições registrou expressivo crescimento de 49,9%, para R$ 18,8 bilhões. Fora que os investidores estrangeiros são isentos de impostos quando adquirem títulos da dívida pública".

O problema é que o governo Lula, apesar de continuar gozando de altos índices de popularidade, é covarde no enfrentamento dos grandes ricos do país. Lula foi eleito no final de 2002 com um programa de mudanças profundas – inclusive na área tributária –, mas preferiu não mexer neste vespeiro que afeta interesses tão poderosos. Entre as tímidas medidas positivas, promoveu duas correções da tabela do IRPF, atendendo a demanda do sindicalismo, o que aliviou a carga tributária dos trabalhadores, mas não corrigiu as distorções históricas. Houve ainda um esforço maior de fiscalização, com a contratação de novos servidores públicos, o que causa chiadeiras dos sonegadores. Mas, infelizmente, o entulho liberalizante de FHC não foi removido nem ocorreram avanços maiores nesta área tão estratégica.

E, por fim, depois da queda da CPMF, a proposta que se anuncia da parte do governo, não é das mais animadoras quanto a mudanças profundas. A única opção, para se ter esperança de maior justiça social, é de que os movimentos populares lutem e cobrem duramente do governo federal que tenha coragem de afrontar as classes abastadas que há 500 anos se nutrem do parasitismo em cima do trabalho da maioria do povo brasileiro. Setores da ultra-esquerda defendem a derrubada do governo Lula, achando que isso esclarece e ajuda o povo, mas, no momento atual, essa atitude só bota água no moinho da direita e por isso é tão estimulada pela grande mídia. Cumpre desmascarar no movimento quem faz, sob retórica aparentemente radical, o jogo da direita, ao mesmo tempo em que se exija do governo que mostre e aprove uma reforma tributária efetivamente justa, no interesse da maioria trabalhadora da nação.

2 comentários:

Anônimo disse...

Acho que nenhuma reforma tributária séria passa no Congresso num ano com eleições. Ainda mais uma reforma que sirva aos que ganham menos. Os mesmos caras que votaram contra a CPMF vão ficar bloqueando qualquer mudança mais profunda só pra ferrar o Lula.

Anônimo disse...

Ano eleitoral com REFORMA TRIBUTÁRIA nem com milagres.....