-->

domingo, 1 de setembro de 2024

Crônicas do abacateiro - 4


Minha neutroglicerina

Na época de infância/adolescência, eu tinha em meu quarto uma espécie de pequeno laboratório, químico e elétrico. Mas planejava transferir materiais, substâncias químicas e equipamentos, pois receava que, algum dia, fazendo algum experimento mais arriscado ou mistura química sem medir bem as consequências, aquilo explodisse, abrisse uma cratera em meu quarto, pelo que certamente não estaria mais aqui escrevendo.

Eu e mais dois amigos, sob nossos 13 anos de idade de doideiras, resolvemos construir um “laboratório” nos fundos do vasto quintal em minha casa de Paranaguá, justamente à sombra do velho amigo abacateiro. Juntamos economias, compramos uma partida de tijolos e cimento, e nos desembestamos à empreitada. Um dos amigos tinha alguma experiência de pedreiro (até se chamava Pedro!) e foi o principal cimentador de tijolos de nossa edificação de 3 x 3 metros. Éramos impulsionados pelas imaginações de tantos filmes de ficção científica que víamos. Um dos projetos era construir um pequeno foguete que realmente decolasse, sabe-se lá para onde.

No entanto, ao longo dos meses, o ímpeto de construção civil foi se desvanecendo, e nosso modesto edifício nunca foi completado, ficando só com as paredes, sem teto, sem piso, sem porta nem janela.

Nesse meio tempo, eu prosseguia com experimentos químicos no acanhado “laboratório” em meu quarto. Na estante de minha tia professora, encontrei um velho livro de Química, datado de 1927. Ora, ali se encontravam instruções sobre como fabricar nitroglicerina, o que me entusiasmou, pois fiquei a imaginar um “sistema de segurança” para proteger nossa construção no fundo do quintal contra intrusos, pelo qual, num intrincado sistema de cordinhas esticadas no meio do mato, o invasor tropeçaria em alguma delas, e isso faria cair um minúsculo frasco contendo o perigoso explosivo nas proximidades, que estouraria perto do sujeito indesejado e o espantado visitante fugiria correndo.

Fui à farmácia e comprei nitrato de sódio, glicerina e enxofre, seguindo as instruções do livro de Química do começo do século XX. Produzi, em meu quarto, uma mistura de uns 10 mililitros dentro de um pequeno frasco e fui testar no fundo do quintal. Joguei-o contra a parede de nossa construção no quintal, e nada aconteceu, exceto a mancha do líquido inerte escorrendo.

O que deu errado? Algum componente comprado na farmácia era falsificado? Errei na preparação? Nunca descobri, mas, se tudo desse certo, eu abriria um imenso buraco no meu quintal, e, pior, poderia derrubar o meu amigo abacateiro. Nunca mais tentei fabricar explosivos, e mantive meu amigo árvore.

Nenhum comentário: