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terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Boulos e o guarda da esquina do AI-5

Em dezembro de 1968, quando o Brasil ingressava na noite do AI-5, que abriu a fase de terror da ditadura militar, o vice-presidente da República Pedro Aleixo produziu uma frase insubstituível sobre a capacidade dos regimes de exceção transformarem a vida do país numa baderna institucional. 

Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:

Justificando seu voto, o único contrário ao AI-5, Pedro Aleixo explicou com a elegância possível na hora que a partir daquele instante a vida política iria se transformar num vale-tudo de atos violentos, sem qualquer amparo constitucional:

- Não tenho nenhum receio em relação ao presidente. Tenho medo do guarda da esquina.

Trinta e nove anos depois, período em que o país enfrentou uma sequencia de barbaridades que não é preciso recordar, a profecia voltou a se materializar na manhã de hoje. Vestindo uniformes cinzentos da PM paulista, um guarda da esquina de 2017 - o termo não tem caráter ofensivo, apenas se refere a um grau na hierarquia das forças responsáveis pela segurança pública - deu ordem de prisão para Guilherme Boulos, líder do MTST, que tentava negociar a retirada de 700 famílias que ocupavam um terreno em São Matheus, na periferia de São Paulo. Então está combinado.

Num país onde a moradia popular é uma tragédia, agravada pela decisão do governo Michel Temer em esvaziar o "Minha Casa, Minha Vida", a única providência que ocorre às autoridades do governo Geraldo Alckmin, o estado com o maior PIB do país, é prender uma liderança que procurava uma saída negociada para o futuro de alguns milhares de pessoas sem casa e sem amparo. "Cometem a violência de despejar 700 famílias e eu é que sou preso por incitar a violência", reagiu Boulos, a caminho da delegacia.

A criminalização de movimentos populares é uma das primeiras estratégias para a construção de toda ditadura. Rebaixando o debate de assuntos obviamente políticos, procura-se retirar a legitimidade de de quem está submetido a uma situação de absoluta destituição de direitos, sem outro meio de negociação além da mobilização. No país de hoje, a prisão de Boulos é uma forma de intimidar e demonstrar força, semelhante a invasão exibicionista da Escola Florestan Fernandes, do MST.

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