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sábado, 20 de dezembro de 2014

Nada de preces para Showtrick - Cap. 4

Agosto, amanhecia em Daytona Beach, quando as águas do Atlântico Norte entregaram à areia um estranho volume.  Marla e Joey, de volta à praia, tinham o hábito de levantar cedo para correr pela praia, e estacaram ofegantes diante daquele cadáver cujos olhos já tinham sido comidos pelos peixes ou pelas gaivotas.

- Ah, meu deus, que coisa horrível!!!!, exclamou Marla olhando para o molambo encharcado ainda lambido pelas ondas.  Esse aí está parecendo o... o...

- O John Dick, nosso tesoureiro da USCU, Marla, completou Joey perplexo.  Mesmo sem aqueles olhos idiotas, não há como não reconhecer que é ele mesmo!  Que diabos aconteceu?

- Ai, que triste e que nojo, Joey! Temos que avisar a polícia...

- Não, não, não...

- Como não?

- Não vamos nos envolver com isto, vamos embora, não tem ninguém na praia, ninguém olhando, vamos em frente e fingir que nem vimos isto.  Vamos, vamos!

- Mmmmas, Joey, é nosso colega, faz poucas semanas estivemos reunidos com ele lá em Orlando! Temos que fazer algo!

- Ele está morto, Marla, não podemos fazer mais nada, e não podemos nos envolver neste rolo. Não quero papo com polícia, vamos embora!  Depois ligamos pra Salvatore.

Marla, chocada e enxugando lágrimas sinceras, relutou mas acompanhou o marido.

O casal se afastou celeremente, olhando para os lados e para a avenida beira-mar, acreditando-se não percebido, sob as vistas apenas das aves marinhas que deviam pressentir no morto um cardápio diferente dos peixes e crustáceos habituais.

Os restos ensopados de Dick, com cinco buracos de bala no peito e na barriga, ainda ficaram à mercê das pequenas ondas de beira-mar e das gaivotas por mais uma hora até que a polícia foi avisada e chegou a equipe da perícia para examinar o que sobrara do velho dirigente sindical.

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- Joey, aquilo foi horrível! Como pode ter acontecido? Marla debatia-se na cama, esperando o efeito do calmante que Joey lhe havia dado.

- Não faço ideia.  Notou que ele foi baleado?  Tinha uns três furos de bala no peito.  Alguém apagou o cara. Não sei por quê.  Um sujeito tão legal e bonachão. Meio burro e devagar, é verdade, mas legal.  Sempre nos tratou bem. Fico com pena.  Mas é melhor esquecer.

- Avisou Salvatore e os outros?  Eles tem que saber, afinal era o tesoureiro do nosso sindicato!

- Ainda não, vou ligar agora. Você trate de se acalmar, e durma um pouco.

Joey pegou o celular e ligou para Orlando, no número de Salvatore.  Ocupado. Ligou para Nelly.  Ocupado também.

- Atendam! Que saco!

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John Dick, antigo enfermeiro da Clínica Geral da Corners University, havia certo tempo que se tornara um burocrata do sindicato.  Não cheirava nem fedia, era um pouco atoleimado, às vezes fazia vistas grossas para umas mutretas de Salvatore, por vezes participava da divisão do “bolo”.  Estava por dentro dos rolos, inclusive por ser tesoureiro.  Tinha sua parte e não costumava encher o saco. Mas era um arquivo sobre duas pernas.  Teria aberto algum jogo perigoso?

Certa vez, tendo brigado com Salvatore, contou a estagiários de um jornal-laboratório da Universidade sobre uma mutreta praticada pelo colega de sindicato, e aquilo foi publicado, ainda que sem citar nomes. Salvatore havia escondido seu próprio carro na garagem de um amigo e dera parte de roubo para receber o valor do seguro. Recebeu o seguro, com o qual comprou um carro novo, e tempos depois o carro supostamente roubado foi achado pela polícia.  Mas então o rolo estava feito, com sucesso.  Dick revelou o estratagema, provocando a ira de Salvatore e por um bom tempo os dois não se conversaram.  Entretanto, o caso não rendeu nenhum problema para Salvatore e tudo voltou às boas entre eles.

Agora, porém, algo diferente tinha acontecido.  Teria a ver com a transação do terreno da USCU?  Ou era outra coisa dentro do sindicato?  Podia também ser mera fatalidade, um assalto...

A unidade CSI que examinou Dick constatou que ele morreu pelos disparos de arma de fogo no tórax e depois foi jogado ao mar, pois não tinha água nos pulmões.  E havia sido na noite que antecedeu seu achado na praia pelo casal Marla/Joey.  O corpo não tinha outros sinais, nos bolsos somente alguns dólares e o documento de identidade.  Caso difícil. Mas era preciso investigar as relações do morto em Orlando e em Daytona. 
[CONTINUA...]

Um comentário:

Rita de Cassia disse...

Sindicato, mutreta, rolo com terrenos. É a ficção imitando a realidade ou vice versa..