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terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

Da "revolução" ao "impeachment"

Como no passado, tenta justificar-se o golpismo criminoso como um combate à corrupção e ao “bolivarianismo”, definido beociamente como um “novo comunismo”.  Como no passado, busca-se encobrir o golpe com eufemismos. Antes era “revolução”. Agora é “impeachment”.

Por Marcelo Zero, no site PML

Antigamente, os que diziam defender a “democracia”, quando queriam se desfazer de governos populares e “defender o país contra o comunismo e a corrupção”, apelavam para as folclóricas quarteladas.

Com o apoio entusiástico da mídia oligopolizada e conservadora, que compunha verdadeiras odes aos golpes em editoriais delirantes, os estamentos militares, armas em punho, se encarregavam de fazer o trabalho sujo de apear do poder líderes populares eleitos em pleitos limpos.

Em alguns países, essa cândida “defesa da democracia” e da “moral anticorrupção” era e é (!) chamada de “revolução”, inacreditável eufemismo que camufla a regressão mais profunda no seu exato oposto.

Entretanto, as quarteladas caíram em desuso na América Latina, região que deu a maior contribuição à existência desse trágico fenômeno político. A última e fracassada deu-se em 2002, na Venezuela então governada por Chávez. Quartelada que, diga-se de passagem, causou “democrático” frisson em muitos órgãos de imprensa tupiniquins. É o tal negócio: o uso do cachimbo deixa a boca torta. A mente também.

Agora, o golpismo adquiriu formas mais sofisticadas e “modernas”. Não há como negar a criatividade e o empenho do nosso entorno regional, quando se trata de apear do poder lideranças populares de esquerda. No Paraguai, por exemplo, inventaram o “impeachment a jato”, baseado em acusações falsas, convenientemente fabricadas pelo aparelho repressor, e levado a cabo por Congresso e Judiciário de baixo compromisso com a democracia. Na Venezuela, criaram o “la salida”, processo político violento embasado no não reconhecimento dos resultados das urnas e em aposta criminosa na ingovernabilidade, que já se reflete em dezenas de mortos e na sabotagem constante à economia venezuelana.

No Brasil, a oposição e sua mídia oligopolizada parecem empenhados na construção de uma síntese dialética entre o impeachment paraguaio e a “salida” venezuelana.

O último pleito não havia sequer acabado e FHC, ex-príncipe dos sociólogos e atual eminência parda do golpismo tupiniquim, condenou os votos de nordestinos e pobres à candidata Dilma Rousseff. Com isso, tentou claramente deslegitimar o voto popular, fundamento último de qualquer democracia. Finda a eleição, o PSDB questionou a lisura do pleito, com a base sólida de comentários do Facebook. Assim, questionou um sistema de votação seguro e moderno, elogiado no mundo inteiro e motivo de orgulho para o Brasil. Frise-se que o questionamento restringiu-se apenas à eleição presidencial, não aos votos que generosamente elegeram Alckmin, Pirillo, Richa e toda a bancada do PSDB. Afinal, para o PSDB e para FHC o voto no governo e no PT não tem legitimidade e valor. Portanto, quando colhe votos para o governo e o PT, o sistema de votação é inseguro e inconfiável, mas quando colhe votos para o PSDB, a lisura do sistema é inquestionável.

Mais tarde, o PSDB tentou ainda impedir a diplomação de Dilma Rousseff, minutos antes da cerimônia oficial, com base no questionamento dos gastos da campanha. Gastos que foram aprovados pelo TSE, com poucas ressalvas meramente técnicas, ao contrário da campanha de Alckmin, por exemplo, que foi rejeitada pelo tribunal eleitoral de São Paulo.

Há pouco tempo, o Instituto FHC teria encomendado, pela módica quantia de R$ 150 mil, parecer “jurídico” de conhecido jurista conservador que procura, de modo pateticamente frágil, deitar as bases legais para um possível impeachment da presidenta recém reeleita em eleições limpas e livres. Como bem assinala Dalmo Dallari, o “parecer” cita uma profusão de leis e dispositivos constitucionais, mas não elenca um único indício ou prova que possa embasar, de fato, um pedido de impeachment. Tudo se assenta na marota e distorcida interpretação da teoria do domínio do fato: se houve algum desmando ou desvio, não importa onde e quando, o dirigente tinha de saber e, consequentemente, tinha a responsabilidade de agir.

Bom, se tal lógica é válida para a presidenta, então ela tem de valer para todos. Para Alckmin, que deixou faltar água em São Paulo. Para Beto Richa, que quebrou o estado do Paraná. Para FHC, que não tinha como não saber da compra de votos na emenda da reeleição e das maracutaias, “no limite da responsabilidade”, nas privatizações. Para os dirigentes do PSDB, que, com certeza, sabiam da quadrilha que se instalou na Petrobras nos anos do tucanato e que foi de lá retirada por Dilma. E por aí, vai. A lista é infindável.

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Fonte: texto e ilustração do site PML


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